Mutretas e monaretas

My Photo
Name:
Location: Salvador, Bahia, Brazil

Thursday, January 03, 2008

Os dias

Fazem meses que eu não vejo você.Já parece lógico,plausível e palpável que nossa vida juntos é uma memória sumindo no horizonte;o barco partiu e com ele tudo de bom ou ruim.

O gosto amargo da dor me deixou,a vida abriu o braços e me leva no seu colo para os anos eu ainda tenho.Existe até a possibilidade de voltar a me sentir amado por alguém que não você.Mas é no seio desses novos dias que a coincidência, ou mesmo a inconsciência da sua perda,traz de volta o muito que não pude dizer,a noção que ainda orbito seu mundo,mesmo que na forma de alguma radiação.Fraca demais para ser sentida e que não é percebida por ninguém à olho nu.

Homens são meninos que cresceram perdendo seus sonhos;são sombras de esperanças não realizadas;são obras incompletas;paredes no reboco precisando de cal,mas esse sou eu,o exemplo vivo dos grandes planos que deram errado,pior:dos não tentados.Os caminhos possíveis para mim sempre foram os do coração:logo aqueles mais fadados ao fracasso.E eu fracassei fragorosamente em cada relacionamento que tentei;por muito,por pouco,por qualquer coisa que o valha,a minha chance nunca parecia chegar.

Quando você chegou na minha história,eu já estava calejado,treinado e adestrado.Eu era uma colagem de pedaços de relações que se mantinham coesas por pura fé.Fé em qualquer espécie de vínculo em que eu não ficasse só.Claro que já sabemos dos capítulos e do desfecho dessa ópera:ela fechou mais cedo por falta de público,os atores ficaram na rua e o empresário sumiu com a bilheteria.Então porque é que ainda me assombra?Qual o esconderijo dessa mágoa?Como tirar ela de lá?

Não sei de nada,me sinto como se dividisse um espaço ínfimo com um completo estranho.Esse que canta, que não me deixa dormir,que te detesta e tem um prazer sádico em relatar os seus erros e se fazer de vítima,o que odeia a existência desse outro,invejando e desejando,aquele que ainda tem lágrimas para chorar.

Passo bons dias sem vê-lo.Tenho estado ocupado,construindo alguma coisa mais palpável do que boas lembranças.O futuro se transformou em agora e agora eu não tenho nem presente.Natal de luta,sem mesa de frios nem canção batida.Uma data a mais a se riscar.Ser frio se tornou sinônimo de ser forte e tudo se torna mais claro;o mundo é cruel e louco,todos trabalham por si, e só existe sonho onde se tem chão.Mas eu ainda tenho de sorrir,de ser amigo,filho,irmão,tio e mais do que tudo pai.E é aí onde o outro volta,onde ainda posso ver você,onde eu me torno ele e os dias demoram de passar.

Old writers and their filthy needs

O velho escritor sai à rua em busca de algo p/ morder,em ambos os sentidos.Na sua atual condição financeira isso parecia mais difícil do que todas as proezas de Heminguay ,incluindo o suicídio;mas a punheta já havia se tornado um grande exercício de lembrança,e as lembranças retornavam p/ as curvas da mesma mulher,e essa; nunca seria sua.

Eram apenas 10 da noite,as luzes dos bares de sempre pareciam mais convidativas;um bom papo sobre qualquer coisa,uma conta gorda e algumas doses de uísque chamavam seus sentidos e faziam sua boca salivar.Mas o “chefe” queria sexo,de preferência com alguém mais jovem e menos inteligente,uma foda casual,algo que pudesse alimentar a chama fria dos seu mundo cinzento que cheirava a solidão e livros velhos.

Cruzou dois quarteirões,e começou a ouvir música vazando pelas paredes das boites à sua frente.Havia uma imensa fila de crianças vestidas como nos filmes do Flash Gordon,com seus olhos pintados e expressões vazias;”um playground de manequins” pensou ele.

Mentiu descaradamente sobre uma filha adolescente,falou em polícia e política e entrou sem maiores delongas.

É claro que ele já havia estado em clubs antes,mas os anos,as drogas e as pessoas eram outras.Ali ele pôde sentir exatamente,o que Isaac Asimov descrevia em seus contos.O futuro tinha luzes demais,sons demais e as drogas melhoraram muito.Andou aturdido até o bar, pediu uma vodka gelada e assim que tomou o primeiro gole,ouviu um grito atrás de si.

No meio de uma boite cheia de menores,era apenas comum,mas o gritos se aproximaram dele e tomaram a forma de uma linda menina.Era o sinal de que alguém o reconhecera,ou que ele além de velho,ele também estava senil.

Sua sorte pareceu sorrir,eram 15 anos de seios firmes,boca carnuda e coxas de bailarina.15 aninhos de “Me apaixonei pelos seus contos” e “Você me acha muito nova?”.Tinha de lembrar das frases mais simples, dos olhares e toques eventuais.Uma arapuca confusa que ele treinou como qualquer homem feio p/ ver se conseguia sexo sem ter de pagar,estava dando certo,conseguiu convencê-la a voltar a sair dali com ele.Tudo o que faltava era um lugar onde esconder o corpo...