Mutretas e monaretas

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Location: Salvador, Bahia, Brazil

Tuesday, July 25, 2017

Mala suerte

Abdias pôs as mãos na cintura, olhou as ondas e foi passo à passo deixando que elas viessem ao seu encontro. Se viu cantando "... é doce morrer no mar...". Trilha sonora ideal para alguém que fosse doce. Se calou, Abdias se sentia amargo como óleo de babosa, a doçura que havia, ela e o salgado mar levaram.
Água chega ao peito, os  tênis já saíram e Abdias de meias se entende ridículo: " Suicida de merda! Nem se despe, não escreve carta e ainda pode ser achado de porra de meia! Vai deixar  dúvida?!Vai ter quem ache que você queria viver. Seu merda! Mentiroso!".
Já não dava pé. Se focou no branco da meia, sentiu saudades da mãe. Olhava o ponto em que ela era cremada como se fosse uma obra em 3d, a ardência no peito e a pressão na cabeça tornavam o vazio  daquele instante pausado perfeitamente alinhado. Desesperou mas não havia som no seu grito. Só água salgada.
 O calor começava à voltar, o vômito e a escuridão já cederam espaço. Agora o escuro tem luzes, estrelas e olhares. Os pescadores das 06:00 os tais Milagres que tanto negou, as tais "probabilidades", acertaram à seu desfavor mais uma vez. Vai ser rebaixado à: "o bicho que tentou", figura peculiar, que troca idéia e não faz mal à ninguém, mas é melhor não colar. 
Na verdade, o pior é que ambos saberiam, ela e o outro. Abdias teve certeza que seria trágico, mas também hilário. Misturou as imagens de seus risos, com o sexo que teriam tido com seus sons e gemidos. Era bem melhor ter ficado na água.